domingo, 21 de fevereiro de 2010

Carta para quem já não sei

Querido amigo,
Grande foi a surpresa ao ver que me procuraste mesmo sem saberes quem eu sou ou sequer se existo.
Não sei quem tu és ou quem tu foste, onde vives ou viveste, e como tal sigo-te as pisadas não pondo dados meus nesta carta, pois não precisas de saber quem eu sou para me escreveres de volta.
Tal como tu, sou uma pessoa apaixonada pela epistolografia, sinto a necessidade de escrever para todos e para ninguém, sofro daquela vontade sufocante de me expressar por escrito. Uma conversa esquece-se mas uma carta pode ser relida inúmeras vezes, guardada ao longo dos tempos, sobreviver à própria morte passando para as mãos de outrem.
Sinto que o mundo está estragado. A tecnologia afastou as pessoas e não sinto gosto por nada em particular, e tenho de escrever porque niguém fala com ninguém.
Leio cartas de há quatro séculos que foram mantidas na minha família (estarás tu a ler isto daqui a quatro séculos também?), e não as compreendo... Falam de crises emocionais, de romances adolescentes, de amores para toda a vida, e até de cartas a um senhor chamado Pai Natal. Pergunto-me de quem ele terá sido pai pois muita gente falava dele.
E o que é tudo isto afinal? Será que já vivo numa época onde os sentimentos, ou lá como lhes chamam, não chegaram? Será que se perderam com o passar das décadas? Diz-me que há esperança. Por favor, diz-me que há esperança! Pois, caso contrário, sinto que o mundo já morreu... E com ele, eu também.

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