terça-feira, 8 de junho de 2010

Qual é que é o problema?

A criança que chora porque não tem que comer. Qual é que é o problema? A mãe que chora porque não tem com que a alimentar. Qual é que é o problema? O homem que chora porque não tem como a cobrir. Qual é que é o problema? A rapariga que chora porque o rapaz nunca chegou a vir. Qual é que é o problema? O rapaz que chora porque não encontrou o caminho para lá chegar. Qual é que é o problema? O sorriso que chora por se ter fechado. Qual é que é o problema? O doente que chora porque não achou a cura. Qual é que é o problema? A cura que chora porque não a quiseram usar. Qual é que é o problema? As pessoas que choram porque já não sabem sentir. Qual é que é o problema? O problema é o mundo. E esse já não chora.

sábado, 5 de junho de 2010

Folha de papel

Escrevi-a. Virei-a ao contrário. Dobrei-a em vários quadradinhos. Letras, palavras, espaços em branco. Perdi-me no mundo das frases, dos monstros de três pernas e onde as fadas jantam ao amanhecer. O Sol pôs-se ao início do dia, e a Lua escondeu-se ao início da noite. Os dragões saltitavam pelos vales e os gatos mediam três metros e meio. Os cães tinham asas e as nuvens eram cor-de-rosa, feitas de algodão doce. Dois pés de sapo, cinco pétalas de rosa, e a bruxa criava a sua poção de rejuvenescimento. Ao seu lado a menina tecia. O despertador tocou. Acordei. Costumavam dizer-me que tinha uma grande imaginação, dificuldade a diferenciar a vida à minha volta da vida que dá voltas dentro da minha cabeça.
Afinal para onde foi a infância?

sexta-feira, 4 de junho de 2010

terça-feira, 1 de junho de 2010

Dia da Criança

Criança desconhecida e suja brincando à minha porta,
Não te pergunto se me trazes um recado dos símbolos.
Acho-te graça por nunca te ter visto antes,
E naturalmente se pudesses estar limpa eras outra criança,
Nem aqui vinhas.
Brinca na poeira, brinca!
Aprecio a tua presença só com os olhos.
Vale mais a pena ver uma cousa sempre pela primeira vez que conhecê-la,
Porque conhecer é como nunca ter visto pela primeira vez,
E nunca ter visto pela primeira vez é só ter ouvido contar.

O modo como esta criança está suja é diferente do modo como as outras estão sujas.
Brinca! pegando numa pedra que te cabe na mão,
Sabes que te cabe na mão.
Qual é a filosofia que chega a uma certeza maior?
Nenhuma, e nenhuma pode vir brincar nunca à minha porta.
Alberto Caeiro